Os curiosos remédios usados para curar reis e rainhas séculos atrás
Há 500 ou 400 anos, ficar doente, muitas vezes, podia ser fatal. Mas para reis e rainhas, contrair uma doença era um problema ainda mais sério: a morte de um monarca poderia desencadear uma sangrenta guerra de sucessão e colocar em risco as conquistas do império.
Por causa disso, todo tipo de remédio era usado para aliviar qualquer mal-estar que acometesse a quem tivesse “sangue azul”.
Nessa época, popularizou-se uma corrente peculiar da medicina antiga: a chamada teoria ou doutrina de assinaturas.
De acordo com essa suposição, que vem da Grécia Antiga, se uma planta se assemelhasse a uma parte da anatomia do corpo humano, ela poderia curá-la.
Acreditava-se, por exemplo, que o gengibre, por sua semelhança com o estômago humano, poderia aliviar doenças digestivas. Coincidentemente, de acordo com alguns especialistas modernos, o uso do tubérculo era adequado para a finalidade a qual se propunha no passado.
Outra planta, a bolsa-de-pastor, era usada para auxiliar na circulação do sangue, e até hoje empresas de medicina natural a recomendam para o tratamento de algumas hemorragias.
Mudança de personalidade
Em 1536, o rei inglês Henrique 8º, fundador da Igreja Anglicana, sofreu um grave acidente durante um torneio no palácio de Greenwich.
Em uma justa (disputa sobre cavalos), o monarca caiu do animal que, por sua vez, caiu por cima dele. Ambos vestiam armaduras pesadas. O rei desmaiou e permaneceu inconsciente por duas horas.
Historiadores acreditam que o episódio tenha sido responsável pela brusca mudança de personalidade do monarca: Henrique 8º passou de homem generoso a tirano paranoico.
Dez anos antes, em 1524, o monarca já havia sofrido um acidente semelhante.
Na ocasião, Henrique 8º ─ que não gostava de abaixar a viseira do capacete ─ foi golpeado no olho direito pela lança do oponente. Depois disso, começou a sofrer constantes enxaquecas.
O remédio prescrito ao monarca foi simples: nozes, pela semelhança com o crânio humano.
Hemorroidas
Mas o fruto seco não era o único alimento consumido pelo rei para aliviar indisposições.
Por razões não tão medicinais, Henrique 8º comia muito: algo em torno de 5,5 mil calorias por dia.
Uma grande parte delas vinha do consumo de carne.
Legumes e verduras, alimentos associados às classes mais baixas, não estavam presentes na mesa do monarca. E quando Henrique 8º os comia, eram sempre cozidos, como as frutas ─ na época acreditava-se que quem comesse frutas cruas poderia contrair peste.
Além disso, um dos principais passatempos de Henrique 8º era andar a cavalo.
Por causa disso, não causa surpresa que o monarca sofresse de hemorroidas.
Pelo menos três homens conheceram intimamente as hemorroidas reais: aqueles que ocuparam a posição de gentil-homem.
Tratava-se de um cargo privilegiado e de responsabilidade médica, pois cabia a eles inspecionar os excrementos do monarca.
Como a medicina dos Tudor – linhagem real à qual Henrique 8º pertencia – se baseava na Hipocrática, a cor da urina ou a consistência das fezes indicava se o monarca estava doente.
No caso das hemorroidas, o remédio prescrito era a raiz de Ranunculus ficaria, por sua semelhança com as veias inflamadas do ânus.
Havia também uma cura para os problemas de digestão que não se inspirava na Grécia Antiga, mas na América recém-descoberta: enemas (lavagem que injeta água no intestino) de fumo de tabaco.
Naquela época, o tabaco havia acabado de chegar à Inglaterra e acreditava-se que o fumo curava muitas dores, entre elas a constipação e a dor do estômago.
Outro grande problema era a sífilis, particularmente entre os marinheiros. Especula-se que Henrique 8º também sofria da doença, mas isso nunca foi confirmado.
O tratamento indicado na ocasião era injetar mercúrio no pênis.
Rainha Virgem
Filha e uma das sucessoras de Henrique 8ª, Elizabeth 1ª era particularmente seletiva com sua comida. Exceto quando se tratava de doces.
Por causa deles, os dentes da monarca ficaram repletos de cáries, escureceram e caíram.
Em determinada ocasião, Elizabeth 1ª teve uma dor de dente tão forte que foi necessário extrair-lhe um molar. Mas a ideia lhe causava tanto pavor que dentistas tiveram de extrair um molar de um bispo na frente da monarca para mostrar que o procedimento não seria doloroso.
Foi o único molar que a rainha permitiu que lhe fosse tirado.
O remédio para a cárie? Hyoscyamus niger. Um de seus vários nomes populares – erva louca – indicava quão arriscado era o tratamento: a planta era venenosa.
A Hyoscyamus niger também era associadas “às bruxas” e conhecida por suas propriedades mágicas.
Na verdade, a planta tinha propriedades psicoativas que incluíam alucinações visuais e a sensação de estar voando.
Cútis angelical
Em 1562, quando Elizabeth 1ª estava no trono havia quatro anos, ela caiu doente.
A rainha ficou tão mal que membros da corte acreditavam que ela morreria.
Ela contraiu varíola, uma das várias epidemias urbanas que frequentemente obrigavam os reis ou seus descendentes a se confinarem em palácios distantes de Londres, ora para prevenir o contágio ora para se recuperar.
Na ocasião, o problema não desapareceu quando a rainha melhorou.
As cicatrizes da doença que permaneceram visíveis em seu rosto poderiam prejudicar a imagem da Rainha Virgem.
As marcas eram similares às da sífilis ou da catapora.
Além disso, elas colocavam em risco a ideia de rosto perfeito com a qual a rainha tinha de representar pureza e força.
Foi por causa disso que Elizabeth 1ª passou a cobrir completamente o rosto com maquiagem branca.
Isso porque sendo virgem e sem herdeiros ela tinha de fazer todo o possível para se manter jovem e atraente, como se nunca envelhecesse.
O remédio para suavizar as cicatrizes era a romã, pela semelhança da fruta com as marcas deixadas pela varíola.
Fonte: BBC